Trás-Os-Montes, esse vasto mundo de paisagens de fazer cair os olhos e de bicharada amiga da gente. Só quem conhece pode sentir isto como se sente o cheiro das castanhas assadas mesmo a estalar.
Este artigo é, muito provavelmente, um dos mais complicados e sérios que escrevo. Sinto-me uma atleta no pódio a ouvir o hino nacional, com a cabeça levantada, olhar profundo para o horizonte, mão na barriga (para afagar o estomago – um transmontano tem sempre apetite).
Venho falar-vos da essência transmontana. E perguntam-se: o que é um transmontano? O que é isso da essência transmontana? Há etiqueta transmontana? Não sejais tolos.
Este é um guia incompleto de coisas úteis para saber antes de se visitar Trás-Os-Montes e os transmontanos.
- A mesa está sempre posta. Não vos admireis nem vos façais de esquisitos. Mesmo que não vos apeteça comer nada, mais vale aceitar logo qualquer coisinha porque não vão parar de insistir. E a intensidade aumenta, com expressões como “Quem não presta para comer, não presta para trabalhar”, “Tens de comer porque já não tem cú para as calças”.
- Tende sempre em mente que o jeito mais bruto a comunicar não é defeito, é mesmo feitio. Não é para afastar ninguém, quanto muito é para afastar a vareja, mas é na brutidão que está a hospitalidade.
- Preparai-vos para encher o carro com coisas da terra e enchidos. Porque um transmontano, mesmo que não produza, tem sempre a despensa cheia de batatas, azeite, cebolas, repolho e ovos.
- Se vos aventurardes a ir para as aldeias mais montanhosas, não espereis trânsito provocado por carros, mas sim pelas ovelhas do Ti Zé da Fonte ou as cabras do Isaltino. Pelo menos elas não apitam.
- Trás-Os-Montes cumpre quase à risca os nove meses de inverno e três de inferno. Portanto, para não dizerdes que não fostes avisados, não penseis que o inverno é para se andar com um casaquinho. É mesmo com camadas e camadas de roupa. Já quanto ao verão, não sei que vos diga, ficai à sombra.
- Tende em consideração usar uns chanatos se forem à aldeia, é provável que haja uma visita às pitas e aos recos.
E estais agora a pensar que ir a Trás-Os-Montes é como visitar a selva. Há lá coisa mais errada. Cidades com carros e confusão e betão, há em todo o lado. Trás-Os-Montes também tem isso tudo. Mas para ver isso, mais vale nem saírem do sítio.
O que é belo nesta região é a gente da terra, as paisagens, a bicharada, a comida. E isto é uma riqueza que não se encontra em todo o lado.
Aproveito também para aconselhar um belo passeio pela nossa Estrada Nacional 304.